Apresentação
Datam de 1914 as premissas pictóricas mais antigas de Alfredo Volpi. Paisagens pinceladas à óleo sobre cartões de pequena dimensão. Resultam da inclinação, dos pendores naturais de um rapaz de 18 anos. Antecedem a decisão de pintar que amadurece, progressivamente, após os estímulos e convites de Orlando Tarquínio, seu parceiro, em 1918, nos trabalhos de decoração do Hospital Militar do Ipiranga.
Ao mestre, separar-se daqueles primeiros cartões [acoav 1955 e acoav 1957] custou pena. Readquiriu-os, conservando-os enquanto esteve entre os vivos. Ainda, cerca de dez anos após seu falecimento, estavam à mostra na parede da sala da casa em que residia.
A presente edição comemora o centenário destes pequenos frutos proféticos. Arautos de gigantesca obra artística. Foram sete décadas de fecundidade que cobriram quase todo o século xx, descontados trinta anos, quinze no início e outro tanto no ocaso. A longevidade permitiu a expressão artística acompanhar o desenvolvimento da cultura brasileira, maximé paulista, contribuindo decisivamente para dar-lhe caráter e fisionomia estética.
A alegria acompanha também o fato de que o esforço para catalogar a obra de Volpi já sobrevive, com perseverança, há 37 anos contados da iniciativa do saudoso Professor Pietro Maria Bardi, então na condução do Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand, em parceria com o próprio Volpi ainda em plena e vigorosa atividade. Tivemos a honra de participar da curadoria dessa fase inaugural.
Por duas vezes, o procedimento interrompeu-se. Consequentemente, dois foram os longos períodos de hibernação. Também duas foram as causas paralisantes. Exauriram-se, em ambas as ocasiões, os recursos financeiros e, de modo crônico, a falta de estrutura institucional explica o duplo desmaio. A constituição do Instituto Alfredo Volpi de Arte Moderna – iavam veio remediar a segunda e mais perversa das causas, permitindo enfrentar a primeira delas com fundada esperança.
A repetida exaustão de recursos financeiros decorre do sistema que a legislação impõe ao emprego dos recursos públicos mobilizados pelo incentivo da renúncia fiscal. No total, são pequenos, face à penúria crônica na qual subsiste a subnutrida atividade cultural e artística de nossa gente. A escassez estimula fatiar radicalmente os quinhões a distribuir, de sorte a diminuir o número dos desassistidos, descontentes e frustrados. Os projetos individualmente contemplados, por tais fatias cujas espessuras beiram a transparência, dependem, por força dos regimentos, de terem começo, meio e fim, resultando num produto demonstrável para quitação de contas.
Já se vê que não se adequam à natureza da catalogação sistemática e racional da obra de um artista, que é permanente e de duração interminável. A procura de trabalhos que se dispersaram e das informações sobre a procedência, tradição e circunstâncias expositivas de cada trabalho individual, prolonga-se indefinidamente, sempre acumulando resultados. A divulgação cultural e a indigitação de contrafações ou circulação de obras, sejam de atribuição duvidosa, sejam de procedência litigiosa ou, mesmo, objeto de ilicitudes, não se concluem. São atividades permanentes.
Somando-se aos motivos de júbilo anteriores, essa edição comemorativa não resulta de patrocínios, nem do emprego de recursos públicos, incentivados ou não. Comemora-se um feito inaugural e promissor. A edição consumiu apenas o produto de doações voluntárias e privadas. É o fruto do esforço particular dos amantes da obra de Volpi. Independente.
Oxalá o serviço prestado e a qualidade desta doce frutificação anime a perseverança dos que sustentam o Instituto Volpi como instrumento contributivo e eficaz de edificação da arte e cultura brasileiras.
MARCO ANTONIO MASTROBUONO
Presidente do Instituto Alfredo Volpi de Arte Moderna (2015)